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Felipe Zmoginski

Entramos na Tencent, a maior empresa de internet da China

Felipe Zmoginski

30/10/2019 04h00


Selfie com o pinguim: por dentro da maior empresa digital chinesa

Líder chinesa em redes sociais, computação em nuvem, streaming de música e games online, maior empresa digital (em valor de mercado) da China, além de presente nas primeiras posições em áreas como meio de pagamento digital, buscas na web e e-commerce. À parte de tudo isso, uma referência mundial no desenvolvimento de soluções de inteligência artificial para robótica, varejo e saúde.

O parágrafo acima poderia ser a "mini bio" da Tencent, empresa com sede em Shenzhen fundada em 1998 pelo ex-estagiário da telecom China Motion, Ma Huateng, que trocou o salário mensal de US$ 176 pelo sonho de construir um império online em seu país. Em uma definição simplista, poderíamos explicar a Tencent como uma mistura de Google, Facebook, Spotify e Amazon, já que a empresa opera, com sucesso, nas mesmas esferas que estes gigantes ocidentais.

No final de setembro, visitei a sede deste conglomerado chinês, acompanhado por Yoyo You, gerente de relações governamentais da empresa que tem suas ações listadas na bolsa de Hong Kong deste 2004. Em fevereiro do ano passado, a companhia atingiu seu pico de valorização, somando US$ 525 bilhões em valor de mercado. Naquele momento, a Tencent foi a terceira maior empresa digital do mundo, atrás apenas do Google (Alphabet) e da Amazon.


Todos os meses 1,13 bilhão de usuários acessam suas contas no We Chat

WeChat, uma solução onipresente

Entre todos os produtos da empresa, o mais conhecido deles é o app WeChat, chamado de WeiXin pelos chineses, uma espécie de rede social (possui feed, chamado de "Momentos) e serviço de mensagem instantânea, como o WhatsApp. O WeChat é também, ao lado do Alipay, do grupo Alibaba, o maior sistema de pagamentos digitais do país que aboliu o dinheiro de papel.

Na China, 1,15 bilhão de pessoas possuem acesso regular à internet móvel, o que, na prática, é virtualmente toda a população economicamente ativa. Desse montante, 95% usam a carteira digital da Tencent, o WeChat Pay. Segundo Jio, todos os dias 1 bilhão de transações financeiras são feitas no país dentro da plataforma, o que a torna um dos maiores bancos de compensação do mundo.

A onipresença deste meio de pagamento tornou-o viável para saldar viagens de metrô, compras na feira de rua ou mesmo fazer transferências de alto valor entre empresas. Métodos tradicionais de diversão (e relaxamento na competitiva sociedade chinesa) como cantar em um karaokê (chamados de KTV) também ganharam versão tech com a ascensão do WeChat. Cabines em shoppings, estações de trem e até em centros empresariais (!!!) permitem aos chineses que se desbloqueie uma porta privativa e aliviem a tensão cantando em alto e bom som em caixas que não deixam seus agudos vazarem para o ambiente externo.

Definido por especialistas como "modelo de negócios invertido", o método aplicado ao WeChat foi o de criação de uma comunidade social que não fosse monetizada via publicidade (como faz o Facebook), mas que pudesse ser útil e concentrar o maior tráfego possível. A partir do elevado tráfego, o WeChat passou a promover uma miríade de serviços, estes sim muito lucrativos, como mobile games, pagamentos móveis e comércio de bens e serviços.


Maquete mostra montanha recortada: túneis sob a montanha guardam dados

Uma nuvem embaixo da montanha

Assim como aconteceu com a Amazon, nos Estados Unidos, e com o Alibaba, na China, a construção de uma grande infraestrutura computacional permitiu o surgimento, no caso da Tencent, de uma divisão em nuvem, que atualmente é a líder na China, à frente do arquirrival Alibaba. A importância do serviço de nuvem da Tencent é tamanha que, em seu maior data center, na região de Gui´an Qixing, sul da China, a companhia escavou uma montanha inteira para criar debaixo da terra uma infraestrutura indestrutível de nuvem.

A região é considerada uma das poucas áreas do território chinês a salvo de terremotos e os data centers subterrâneos sugerem mais que sofisticação tecnológica da companhia, mas algum tipo de colaboração com os planos de segurança nacional do governo chinês. Entre os serviços que consomem grande tráfego de dados da Tencent estão suas empresas de games e as plataformas de social streaming de jogos online, uma febre (e uma máquina de fazer dinheiro) no país.


Catracas do metrô liberadas por mobile payment: com We Chat, as portas se abrem

Se a presença da Tencent é dominante em áreas consolidadas como nuvem e redes sociais, a companhia mantém divisões focadas (e com investimentos que chegam as 12% do faturamento bruto da empresa) na criação de produtos futuristas, a serviço de seu laboratório de inteligência artificial, braço mais relevante de inovação da empresa.

Entre os produtos em teste criados pelo laboratório da Tencent estão uma versão proprietária de carro autônomo, soluções inteligentes para varejo (como lojas automatizadas) e uma linha inteira de AI para aplicações médicas, como algoritmos que leem exames e geram relatórios, reduzindo os custos (e os erros) cometidos por médicos humanos.


Carro autônomo da Tencent: um futuro sem motoristas e sem acidentes

Sobre o autor

Felipe Zmoginski foi editor de tecnologia na revista INFO Exame, da Editora Abril, e passou pelos portais Terra e America Online. Foi fundador da Associação Brasileira de Online to Offline e secretário-executivo da Associação Brasileira de Inteligência Artificial. Há seis anos escreve sobre China e organiza missões de negócios para a Ásia. Com MBA em marketing pela FGV, foi head de marketing e comunicações do Baidu no Brasil, companhia líder em buscas na web na China e soluções de inteligência artificial em todo o mundo.

Sobre o Blog

Copy from China é um blog que busca jogar luzes sobre o processo de expansão econômica e desenvolvimento de novas tecnologias na China, suas contradições e oportunidades. O blog é um esforço para ajudar a compreender a transformação tecnológica da China que ascendeu da condição de um país pobre, nos anos 80, para potência mundial.