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Felipe Zmoginski

App de vídeo: por que o sucesso do Kwai tem relação com influencers novatos

Felipe Zmoginski

15/07/2020 04h00

No Kwai, Lara Romeiro alcançou um milhão de seguidores ensinando passinhos online (Reprodução/ Kwai)

Você já deve ter visto em sua timeline do Facebook ou em grupos de WhatsApp vídeos curtinhos, com no máximo 15 segundos, marcados com um logo alaranjado com formato de câmera de vídeo. Trata-se de (mais um) app chinês que se populariza rapidamente entre os brasileiros, o Kwai.

Se, por anos, se discutiu se a China seria capaz de fazer com soluções de software o que já faz com hardware e conquistar consumidores "fora de casa", fenômenos como AliExpress, TikTok e Kwai dão uma resposta clara: sim.

No mundo, o Kwai tem 300 milhões de usuários diários e já figurou como "aplicação mais baixada" no Google Play em ao menos oito países, entre eles o Brasil, onde soma 12 milhões de fãs.

O sucesso vertiginoso da aplicação – originalmente criada para geração e compartilhamento de GIFs – levou a gigante Tencent, maior companhia de internet da China, a anunciar investimentos de US$ 2 bilhões na empresa com sede em Pequim. Curiosamente, a Tencent é também investidora do rival TikTok, um modelo de investimento muito típico para quem conhece a Tencent: aposta-se em vários competidores, garantindo vitória em qualquer caso. A notícia do aporte fez o valor de mercado da empresa Kwaishou alcançar US$ 29 bilhões, o que já a coloca entre os maiores unicórnios do mundo.

No Brasil, um mercado já dominado por Instagram e Snapchat, que chegaram primeiro ao país, o Kwai teve a inteligência de adotar um algoritmo mais "aberto", em que influenciadores iniciantes têm seu conteúdo entregue em larga escala, mesmo quando ainda não têm muitos fãs.  A tática se contrapõe, por exemplo, ao que fazem serviços como Facebook, que mantêm seus usuários irremediavelmente dentro de suas bolhas, visualizando conteúdos e interagindo, quase sempre, com pessoas que pensam como elas.

"Nosso algoritmo permite que o conteúdo de novos criadores seja visto de maneira mais justa e dá a nossos usuários a chance de se comunicar com toda a comunidade, visualizando vídeos de mais autores diferentes", disse ao blog Wu Yan, diretora de operações do Kwaishou, empresa que controla o app.

Na maior parte das redes sociais, o principal critério de "entrega" é o nível de interação do autor de um conteúdo com outros usuários. Quanto mais o autor interage com likes ou comentários e é marcado por outras pessoas, maior a probabilidade de aparecer no topo do feed de postagens.

Quem interage pouco nas redes sociais, por consequência, acaba limitado ao seu grupo de contatos e têm poucas chances de mostrar seu conteúdo a mais pessoas. A lógica do algoritmo do Kwai é identificar o interesse de cada usuário e entregar conteúdos que possam lhe parecer relevante, mesmo que produzidos por "autores" iniciantes ou sem muitos seguidores.

O método de entrega parece interessante para a rede que dependerá de ter mais "influenciadores relevantes" em sua plataforma para continuar crescendo no Brasil. Uma das estrelas locais do Kwai, por exemplo, é a dançarina Lara Romeiro, que ensina passos e coreografias online. Lara poderia usar qualquer plataforma para entregar seus vídeos. Escolheu o Kwai e, por conta da característica do algoritmo, está perto de bater 1 milhão de seguidores em três meses de "postagens". Em outra rede, a jornada seria mais longa, justamente por causa do algoritmo.

No Brasil, a empresa que tem operação local, a exemplo do rival TikTok, buscou parcerias com funkeiros, organizadores de festas populares, como São João e canais de música, como Kondzilla. A tentativa é atrair para o app os fãs destes eventos e de cantores populares. Quem navega pela timeline do aplicativo, no entanto, será confrontado com uma enxurrada de vídeos ao estilo "vídeo cassetadas" e esquetes de humor "pastelão" involuntário. São engraçados e, por isso, viralizam.

Ao capturar a audiência de 12 milhões de brasileiros, o app torna-se também mais uma vitrine digital para marcas exporem seus produtos, seja com conteúdo orgânico ou com publicidade, modelo de negócios que sustenta a empresa.

Na China, com o advento da pandemia, serviços de e-commerce migraram também para apps como Kwai, em que "influenciadores" vendem produtos e tiram dúvidas dos consumidores ao vivo. É uma tendência que, a julgar pelos movimentos recentes de Magazine Luiza e Lojas Renner, que estrearam serviços de live commerce recentemente, devem se popularizar no país.

Sobre o autor

Felipe Zmoginski foi editor de tecnologia na revista INFO Exame, da Editora Abril, e passou pelos portais Terra e America Online. Foi fundador da Associação Brasileira de Online to Offline e secretário-executivo da Associação Brasileira de Inteligência Artificial. Há seis anos escreve sobre China e organiza missões de negócios para a Ásia. Com MBA em marketing pela FGV, foi head de marketing e comunicações do Baidu no Brasil, companhia líder em buscas na web na China e soluções de inteligência artificial em todo o mundo.

Sobre o Blog

Copy from China é um blog que busca jogar luzes sobre o processo de expansão econômica e desenvolvimento de novas tecnologias na China, suas contradições e oportunidades. O blog é um esforço para ajudar a compreender a transformação tecnológica da China que ascendeu da condição de um país pobre, nos anos 80, para potência mundial.